Menu
Menu
Lupa

História da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Pirenópolis

Histórico da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Pirenópolis, que desde 1728, através de Irmandade do Santíssimo Sacramento, a mais antiga irmandade de Goiás, deu origens às tradições e às paróquias de toda a região oriental do estado de Goiás.

Irmandade do Santíssimo Sacramento

Imagem da Padroeira, Nossa Senhora do Rosário, proveniente de Portugal, adquirida em 1728 pela Irmandade do Santíssimo. FOTO: Edgar Jacinto, IPHAN – 1955.
Imagem da Padroeira, Nossa Senhora do Rosário, proveniente de Portugal, adquirida em 1728 pela Irmandade do Santíssimo. FOTO: Edgar Jacinto, IPHAN – 1955.

Por Marcos Ribeiro

As origens da Paróquia Nossa Senhora do Rosário é ligada a um passado obscuro na visão histórica devido a falta e ausência dos documentos, mas sabe-se que tem seus princípios relacionados a fundação de Meia Ponte, atual cidade de Pirenópolis, onde, segundo a tradição oral, em 07 de outubro de 1727 foi celebrada uma missa, às margens do Rio das Almas, celebração oficiada pelo Pe. Antônio de Oliveira Gago. Tal dia é no catolicismo a memória litúrgica de Nossa Senhora do Rosário, a padroeira de Pirenópolis.

Em 1728, a sociedade da então Minas de Nossa Senhora do Rosário de Meia Ponte, com as devidas provisões e licenças da época, erigiram a Irmandade do Santíssimo Sacramento que assim como nas demais cidades do período colonial brasileiro, era a irmandade responsável pela construção das igrejas matrizes, pois até então somente nestas igrejas poderiam haver o sacrário. Neste período, a Irmandade do Santíssimo começou a celebrar, além da Festa da Padroeira, os solenes atos da Semana Santa e Corpus Christi.

Em 1731, foi erigida próximo a atual Praça do Coreto, uma missão dos Esmolares da Terra Santa, fundada em Meia Ponte pelo Frei João de Jesus e Maria e auxiliado por Frei Domingos de Santiago, que sob sua liderança edificaram o Hospício da Terra Santa, uma rede de hospedarias para religiosos franciscanos que percorriam vilas e cidades arrecadando esmolas para a conservação dos Terra Santa na Palestina. Tal rede, também neste período, foi edificada nas cidades de Salvador, Recife, Rio de Janeiro, Ouro Preto, Sabará, São João Del Rei, Diamantina, Cidade de Goiás, Itu e São Paulo. O convento de Pirenópolis era dedicado a Nossa Senhora da Conceição.

Conforme o Livro de Batistério, ainda presente no arquivo paroquial, partes da igreja foram concluídas rapidamente, pois já em 1732 foi realizado o primeiro batismo na Igreja do Rosário, demonstrando assim a organização e agilidade de Meia Ponte, que almejava ser a Capital de Goiás bem como Diocese, um plano traçado por Dom Antônio Luís de Távora, Conde de Sarzedas. O que não se realizou devido a morte deste governador.

Nasce a Paróquia

Igreja Matriz de Pirenópolis, em meados do século XX, durante a Procissão de Ramos na Semana Santa. FOTO: João Basílio de Oliveira. Cópia pertencente ao Arquivo da Irmandade do Santíssimo.
Igreja Matriz de Pirenópolis, em meados do século XX, durante a Procissão de Ramos na Semana Santa. FOTO: João Basílio de Oliveira. Cópia pertencente ao Arquivo da Irmandade do Santíssimo.

Em 1734, foram iniciados os registros no Livro de Óbitos dos sepultamentos dos membros da Irmandade do Santíssimo e demais autoridades realizados no local. Atuaram neste período vários padres diocesanos: José Vieira de Paiva, José Pinto Braga, José Cardoso Marinho, Manuel Teixeira, Antônio de Oliveira Gago, chegando ao número de 15 padres atuantes na paróquia.

"Aos dois dias do mez de Março de mil esette centos e trinta e dous anos Baptisei e pus os Stos. Oleos a Franco, filho legítimos de Bartholomeu da Costa e de Maria Cardoza, foram padrinhos Luiz de Brum da Sylveira e Leonor… fiz este termo, dia mez era ut supa." – Joseph de Frias e Vasconcellos.(Do livro de Batistério de 1732 a 1747, fls. 25 ?)

Neste período, devido as muitas irregularidades na exploração do ouro, assassinatos e contrabandos no Arraial de Meia Ponte, em 1732, o visitador diocesano Pe. José de F. Vasconcelos, tornou-se capelão como interventor, estando a frente da Capela do Rosário até 1734, ano em que Pe. Pedro Monteiro de Araújo assumiu como primeiro padre provisionado, ficando a frente da paróquia até 1741.

Durante a administração de Monteiro, a Capela do Rosário foi elevada a condição de Igreja Matriz, desmembrada da Paróquia de Sant'Ana de Vila Boa, a primeira paróquia de Goiás, sendo, portanto, a do Rosário a segunda em idade no estado.

A partir de outubro de 1737, o Livro de Óbitos passam a registrar assentos em Corumbá de Goiás, cuja Capela Nossa Senhora da Penha de França, inaugurada em 1734 e subordinada a Paróquia do Rosário, passou a contar com assistência, em 1747, na qual foi designado para esta localidade o Pe. Antônio Soares.

A Capela da Penha, elevada a Matriz em 1840 foi a precursora das paróquias de Abadiânia, Alexânia e Cocalzinho. A influência portuguesa da Paróquia Nossa Senhora do Rosário, reproduziu na Capela da Penha de Corumbá, as tradições pirenopolinas, tais como as Irmandade do Santíssimo, celebrações da Semana Santa, Festa de São Sebastião, Festa do Divino, Coro, Orquestra e banda de música nas missas e procissões, além das Cavalhadas, realizadas na cidade de Corumbá em Setembro, na Festa da Penha, a padroeira daquela cidade.

A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos

Panorâmica da Rua do Rosário com Igreja do Rosário dos Pretos ao fundo, em meados de 1886.
Panorâmica da Rua do Rosário com Igreja do Rosário dos Pretos ao fundo, em meados de 1886.

Em 22 de dezembro de 1742, o visitador Pe. José F. Vasconcellos autorizou a criação da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, que em 1743, deu início a construção de sua sede, a Igreja do Rosário dos Pretos. Com o andamento das obras na Igreja do Rosário dos Pretos, a Irmandade do Rosário conseguiu a aprovação de seu estatuto em 22 de agosto de 1758, e neste momento, com a estrutura organizada, a Irmandade do Rosário dos Pretos passou a celebrar o Reinado de Nossa Senhora do Rosário, a Festa do Rosário dos Pretos, naquela igreja, celebrada sempre no primeiro domingo de outubro solenemente pelo Capelão da Irmandade, ou seja, um dos vigários da Paróquia. Neste momento, inicia-se a parte folclórica da Congada, Banda de Couro e demais costumes africanos, tradições que a Irmandade do Rosário mantinha na Igreja do Rosário, folguedos que hoje, são realizados dentro das celebrações da Festa do Divino.

Neste período foram criadas outras 3 irmandades na Igreja Matriz com seus respectivos altares laterais na nave: Irmandade Almas de São Miguel, Irmandade de Santo Antônio e Irmandade de Sant’Ana, além da Ordem Terceira de São Francisco de Paula, responsável também pela construção de um dos altares laterais da Igreja Matriz. Com a mudança dos Esmolares da Terra Santa para Traíras, a ordem terceira passou a administrar o hospício e capela até sua transferência para o estado, que o transformou em instituição de ensino e posteriormente o demoliu no século XIX.

Em meados de 1746 surge a Capela de Santa Luzia no julgado de Luziânia, subordinada a Paróquia do Rosário. Por Alvará de 21 de dezembro de 1756, a Capela de Santa Luzia foi erigida em Paróquia. Do território inicial da Paróquia de Luziânia, foram criadas as atuais Diocese de Luziânia, Diocese de Formosa e Arquidiocese de Brasília.

No denominado Arraial Córrego do Jaraguá, atual cidade de Jaraguá foi concluída em 1748, a Igreja São José e Nossa Senhora da Penha, contando com a assistência espiritual da Paróquia do Rosário. Assim como em Corumbá de Goiás os costumes realizados na Paróquia do Rosário foram reproduzidos na Igreja da Penha de Jaraguá, que foi elevada à categoria de Paróquia em 1833 e dessa Paróquia, foram criadas as Paróquias das cidades: Petrolina, Uruana, Goianésia, Rialma, Itaguaru, Santa Isabel e São Francisco de Goiás, que por sua vez originou as Paróquia de Jesúpolis.

A Igreja do Carmo

Igreja Nossa Senhora do Carmo, às margens do Rio das Almas
Igreja Nossa Senhora do Carmo, às margens do Rio das Almas

Em 1750, Luciano da Costa Teixeira e seu genro Antônio Rodrigues Frota construíram, na margem direita do Rio das Almas, a Igreja Nossa Senhora do Carmo, até então Capela particular. A capela era dotada com todo o necessário para o Culto Divino. Com a morte dos benfeitores, sepultados na igreja e sem herdeiros, no século XIX, a igreja foi incorporada ao patrimônio paroquial. A Igreja possui talha barroca e preserva retábulos e peças provenientes da demolição de outros templos da cidade, que hoje compõem o Museu de Arte Sacra local. No local, em 1940, foi criada a confraria de Nossa Senhora do Carmo, atualmente extinta.

A Igreja do Bonfim

Igreja do Bonfim
Igreja do Bonfim

Também em 1750, por iniciativa do Sargento-mor Antônio José de Campos, foi construída a Igreja Nosso Senhor do Bonfim, considerada uma das preciosidades barrocas do estado. O Sargento Campos adquiriu e trouxe de Salvador uma Imagem do Senhor do Bonfim, além de ornamentá-la com altares e pinturas. Nesta Igreja, no século XVIII, instalou-se a Confraria de Nosso Senhor do Bonfim, hoje extinta. Tal confraria patrocinava semanalmente as sextas-feiras a celebração de Missa, com coro e orquestra.

A Igreja do Bonfim, em diversas ocasiões serviu como substituta da Igreja Matriz, quando a Matriz estava em reparos, sendo nesta igreja celebrada algumas Festas do Divino.

Igreja da Boa Morte da Lapa

Igreja Nossa Senhora da Boa Morte da Lapa. Ilustração de Pérsio Forzani
Igreja Nossa Senhora da Boa Morte da Lapa. Ilustração de Pérsio Forzani

Em 1757, foi construída a Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte da Lapa, pela Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte da Lapa. Apesar de nunca ter sido concluída, esta Igreja tinha uso constante, possuindo bens materiais de valor tal como prataria e demais objetos litúrgicos além da imagem de Nossa Senhora da Boa Morte. Em 1869, a igreja ficou em ruínas devido a falta de reparos, causando sua demolição. Todas as imagens, paramentos e móveis foram transferidos para a Igreja do Carmo, onde até hoje se encontra a imagem da Boa Morte.

A música sacra

Também em 1757, conforme atesta os Livros de Atas da Irmandade do Santíssimo, a Irmandade do Santíssimo construiu o coro na Igreja Matriz e assim possibilitou o início da música sacra na cidade de Pirenópolis. Passaram a atuar neste momento, através do patrocínio das Irmandades, sobretudo a do Santíssimo, diversas orquestras sacras, que executavam música barroca em latim. Também as irmandades patrocinavam a produção e composição musical local. Destacou-se neste assunto o pirenopolino Antônio da Costa Nascimento.

A única orquestra remanescente de séculos passados e em atuação é o Coro e Orquestra Nossa Senhora do Rosário, fundado em 1893 em conjunto com a Banda Phoenix. A atuação da Orquestra do Rosário ainda mantém o uso do latim e das músicas barrocas, sobretudo nas celebrações tradicionais.

Tradições e folclore

Em 1811, foi autorizado na Igreja do Rosário dos Pretos a instalação da Irmandade de São Benedito. Assim como a Irmandade do Rosário, a de São Benedito concentrou grande parcela da população negra. Na igreja do Rosário a Irmandade de São Benedito era responsável pela manutenção de um dos altares laterais.

Nos moldes do Reinado do Rosário, a Irmandade de São Benedito iniciou a Festa do Juizado de São Benedito que anualmente era realizada no dia 04 de abril. Atualmente, é realizada na terça-feira após pentecostes.

Apesar de ser realizada desde meados do século XVIII, somente em 1819 a Festa do Divino passou a contar com a figura do Imperador do Divino. Desde então passou-se a contar a partir desta numeração dos imperadores as edições da festa. Inicialmente somente pessoas influentes na sociedade e membros da Irmandade do Santíssimo poderiam ocupar tal cargo. Hoje pode ser ocupado por qualquer pirenopolino. Para a Festa do ano de 1826, Pe. Manoel Amâncio da Luz mandou confeccionar a Coroa do Divino e doou-a a Irmandade do Santíssimo, sendo também na Festa de 1826 que foi introduzida ou impulsionada a prática já existente das Cavalhadas.

Cemitério São Miguel

Retábulo da Capela do Cemitério São Miguel. Foto de Marcos Ribeiro
Retábulo da Capela do Cemitério São Miguel. Foto de Marcos Ribeiro

Em 10 de julho 1832, o julgado de Meia Ponte foi elevado a vila, e em 18 de novembro deste mesmo ano, ocorreram as primeiras eleições para câmara municipal. Em 14 de abril de 1833, por não haver nenhum edifício destinado para tal fim, a Irmandade do Santíssimo cedeu o consistório para que, além do uso da própria Irmandade, funcionasse também as sessões da Câmara. Dos 7 primeiros vereadores, 3 eram padres da paróquia e os demais, membros da Irmandade. A Câmara funcionou no local até mudar para um local específico.

Em 1856, devido a questionamentos sobre saúde pública, começou-se na cidade a discussão sobre a necessidade de construção de um cemitério e a paralisação dos sepultamentos nos templos religiosos. A Câmara Municipal tomou providências obrigando os fazendeiros e lavradores da região contribuíram financeiramente para o empreendimento. Neste período, a maioria da população local era rural, tendo em vista da mudança da economia de mineração do ouro no final do século XVIII para a agricultura. Como não funcionou a obrigatoriedade imposta pela Câmara, a Irmandade do Santíssimo, por iniciativa própria, entre os anos de 1867 a 1869 construiu o Cemitério São Miguel, e assim a cidade passou a contar com cemitério, cuja documentação ainda existe no arquivo paroquial. Atualmente a administração do referido cemitério é de responsabilidade da prefeitura local, A capela de entrada e a de celebrações do referido cemitério, que ainda possui um retábulo com traços barrocos, são Patrimônio Cultural do Município.

Expansão e desmembramento

No início de 1871 na região de Sant'Ana das Antas, atual Anápolis, iniciou a construção da Capela de Sant'Ana. Para o local, foi provisionado o vigário paroquial Pe. Francisco Inácio da Luz, que já em 1873 tornou-se o primeiro pároco desta localidade. Através da Paróquia de Sant'Ana foram criadas todas as paróquias de Anápolis, hoje Diocese de Anápolis, além das Paróquias nas cidades: Nerópolis, Brazabrantes, Nova Veneza, Damolândia, Goianápolis , Ouro Verde de Goiás e Campo Limpo de Goiás.

Arte e patrimônio

O retábulo-mor da antiga Igreja do Rosário dos Pretos foi remontado na Igreja Matriz
O retábulo-mor da antiga Igreja do Rosário dos Pretos foi remontado na Igreja Matriz

Em 29 de fevereiro de 1896, Dom Eduardo Duarte Silva expediu uma provisão pela qual designava a Irmandade do Santíssimo como fabriqueira da Igreja Matriz. Em 22 de março do ano seguinte, aquela confraria, por unanimidade de sua mesa, elegeu para as funções de fabriqueiro, o honrado meiapontense Sebastião Pompeu de Pina, que exerceu as respectivas funções até a sua morte. Em 04 de janeiro de 1901, deliberou a Irmandade do Santíssimo Sacramento adquirir a casa de propriedade de Joaquim Gomes da Silva, situada na rua “Vigário Nascimento”, atual Rua Direita, por 1:300$000, para residência do novo vigário que deveria vir, Condição essa imposta pelo ordinário diocese. Depois da morte do padre José Joaquim do Nascimento, diversos sacerdotes estiveram em Pirenópolis, mas em caráter transitório. Não efetivada a compra do imóvel acima citado, em 24 de fevereiro seguinte, resolveu aquela confraria comprar por 1:500$000 a casa da Rua Nova, atual Pouso do Sô Vigário, que durante décadas foi a casa Paroquial. Com os melhoramentos de que necessitava, ficou o imóvel em 4:000$000. Como a Irmandade, na ocasião, só dispunha de 2:600$000, o prestante cidadão Joaquim Pereira Vale emprestou-lhe, sem juros, a quantia de 1:400$000. O primeiro pároco a ocupar a referida casa foi o padre Francisco Xavier Savelli, italiano, quem no mesmo ano adquiriu no Rio de Janeiro uma imagem do Sagrado Coração de Jesus, chegando a imagem no dia 11 de junho na Igreja Nosso Senhor do Bonfim e de lá, em procissão acompanhada por todas as irmandades, a Banda Euterpe e a Banda Phoenix, foi entronizada no antigo altar de Santo Antônio na Igreja Matriz. Também Padre Savelli introduziu na paróquia o Apostolado da Oração, que até hoje realiza as celebrações do Sagrado Coração de Jesus.

Em 1941, a Igreja Matriz foi tombada como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, sob o processo nº 241-T-1941, inscrita no Livro do Tombo Histórico sob nº 165, de 03 de julho de 1941. O tombamento incluiu todo o seu acervo, de acordo com a Resolução do Conselho Consultivo da SPHAN, de 13 de agosto de 1985, referente ao Processo Administrativo nº 13/85/SPHAN. Ao mesmo tempo em que se preservara a história através do tombamento da Igreja Matriz, começou a destruição da Igreja do Rosário dos Pretos. Segundo José Claudino da Nóbrega, neste período, ele comprou diversas peças da antiga Igreja do Rosário, e seu vendedor destinou o produto da venda à ajuda na construção de um ginásio, o antigo Colégio Nossa Senhora do Carmo, atual Aldeia da Paz e ainda diz:

"Fui a Pirenópolis mais de dez vezes. Numa delas comprei um “monte” de entalhes que estava depositado na sacristia da Matriz. O velho comendador, que tomava conta de tudo, reuniu a 'irmandade dos homens pardos de nossa Senhora do Rosário' e, na reunião foi autorizada a venda, evento registrado em ata. O tesoureiro da irmandade recebeu o pagamento e firmou recibo. Instrui um carpinteiro para que providenciasse madeira e executasse as embalagens. Na hora da saída do caminhão, surgiu o prefeito municipal, (que era da família Pina) e embargou a venda. Procurei o juiz da comarca e este, examinando os documentos que tinha em mãos, disse-me que garantiria a saída dos objetos através da polícia. Saí eufórico, mas a alegria não durou, pois o vigário, informou-me que tanto o Prof. Jarbas Jaime como os irmãos Curado eram frontalmente contrários ao negócio. Preferi devolver as mercadorias e fui prontamente reembolsado. Os Curados, fazendo jus à sua aristocrática origem, espontaneamente me ressarciram das despesas feitas. Há vinte e poucos anos fui a Pirenópolis com a finalidade específica de adquirir duas arcas de valores. Encontrei, no convento das freiras, alguns entalhes da velha Igreja do Rosário, os mesmos que já comprara e não pudera trazer. A mais bela de todas as imagens que pertencera àquela igreja, adquiriu-a o Sr. Renzo Pagliari, em 1959. Nesta ocasião, adquiri do Prof. Jarbas uma excelente cômoda “D. José”, que transferi ao Sr. Hélio de Almeida Leite; hoje, esta peça decora o Palácio do Governo de São Paulo."

Após as vendas das peças, começou-se também a demolição da Igreja do Rosário dos Pretos. O altar-mor tinha entronizada a imagem de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, hoje abrigada na Igreja do Carmo. Nos dois nichos laterais do altar-mor ficavam as imagens de São Rafael e São Bento. Ambas as imagens se encontravam na Matriz no dia do incêndio. O altar-mor chegou a ser vendido. No entanto, a reação enérgica da população local evitou que ele fosse transportado para São Paulo e, com o incêndio da Igreja Matriz, hoje encontra-se montado como altar-mor. O altar lateral direito era dedicado a São Sebastião, cuja imagem, levada para a Igreja do Bonfim, foi de lá furtada em 1978. O altar lateral esquerdo era dedicado a São Benedito, cuja imagem hoje se encontra na Matriz. Demais imagens, alfaias, paramentos, móveis e demais pertences do templo foram repartidos entre essas três igrejas ainda hoje existentes na cidade.

Em setembro de 1978 ocorreu o maior roubo de peças artísticas de Goiás, ocorrido na Igreja do Bonfim, na época calculados em três milhões e meio de cruzeiros. Foram levadas peças do século XVIII, dentre imagens barrocas, pratarias e demais objetos, sendo eles: 1 imagem de Santa Bárbara e 1 de Santa Luzia, ambas francesas, 1 imagem de Nossa Senhora da Conceição e 1 de Santa Ana e 01 do Divino Pai Eterno de Veiga Valle. Além de quatro crucificados e dois castiçais de madeira. Prataria setecentistas: 4 castiçais, turíbulo, naveta, ostensório, cálice e patena. Têxteis: Casula e estola em fio de ouro. Segundo notícia publicada no jornal O Globo, no dia 01 de novembro de 1978, atribuiu-se o furto a Ivan Ferreira Santos, que atendia pelo pseudônimo de Sandra, que foi preso e depois solto. Segundo a reportagem, Ivan havia sido preso no Rio de Janeiro, também acusado de roubo de peças sacras em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e em estados do nordeste. Quanto ao paradeiro das peças de Pirenópolis, até hoje são desconhecidas.

Patrimônios tombados

Cetro e coroa do Imperador do Divino e a bandeira ao fundo
Cetro e coroa do Imperador do Divino e a bandeira ao fundo

Em 1989, com o tombamento do Centro Histórico de Pirenópolis pelo IPHAN, as igrejas do Bonfim e do Carmo, localizadas dentro deste perímetro tornaram-se Patrimônio Nacional. Em 5 de setembro de 2002 a Igreja Matriz sofreu um incêndio que consumiu o telhado e toda a parte interna do monumento. No mesmo ano, iniciaram-se as obras de salvamento emergencial do edifício. O início das obras de restauração aconteceu em 2003. Em 2004, foi aberta a exposição Canteiro Aberto e a inauguração do templo reconstruído ocorreu em 30 de março de 2006. Desde então a igreja está com seu uso regular, e voltou a ser o principal templo da paróquia.

Em 2010, a Festa do Divino Espírito Santo foi reconhecida como Patrimônio Cultural e Imaterial Brasileiro pelo IPHAN.

Em 2019, a Irmandade do Santíssimo, seus arquivos e documentos e os costumes iniciados ou continuados por ela (Celebrações Quaresmais, Festa de Passos, Semana das Dores, Semana Santa , Festa do Divino, Corpus Christi, Festa do Rosário) foram declarados Patrimônio Imaterial e Cultura do Município, que em 2020 e 2021, durante a pandemia do Coronavírus foram realizadas em formato inédito, sem a presenças dos fiéis e transmitidas pelas mídias sociais pela PASCOM, Pastoral da Comunicação, mas sem perder sua essência tradicional, como o uso das imagens barrocas, procissões com Banda de Música e a entoação dos cânticos em latim.

Crédito

Artigo de Marcos Vinícius Ribeiro dos Santos. Arquiteto e urbanista, secretário da Irmandade do Santíssimo Sacramento, tenor do Coro e Orquestra Nossa Senhora do Rosário, trombonista da Banda Phoenix.

Referências

BERTRAN, Paulo. História da terra e do homem no Planalto Central: Eco-história do Distrito Federal: do indígena ao colonizador. Brasília: Solo, 1994. 270p.

CASTRO, José Luiz de. A organização da Igreja Católica na Capitania de Goiás (1726-1824). Goiânia: UCG, 2006.

CAVALCANTE; Silvio. Barro, Madeira e Pedra: Patrimônios de Pirenópolis. IPHAN, 2019. 352. p.: il.

CURADO, Glória Grace . Pirenópolis uma cidade para o Turismo. Goiânia: oriente, 1980.

CURADO, João Guilherme da Trindade. Lagolândia - paisagens de festa e de fé: uma comunidade percebida pelas festividades. Tese (Doutorado em Geografia), IESA/Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2011.

__________________ Difusão da fé: procissão do Senhor dos Passos em Pirenópolis/GO. REVER - Revista de Estudos da Religião. São Paulo, v. 19, n. 3, 2019.

JAYME, Jarbas. Esboço Histórico de Pirenópolis. Goiânia, Editora UFG, 1971. Vols. I e II.

JAYME, Jarbas. JAYME, José Sizenando. Casas de Deus, casas dos mortos. Goiânia: Ed. UCG, 2002.

LÔBO, Tereza Caroline. Capela do Rio do Peixe em Pirenópolis/Goiás: Lugar de Festa. Goiânia, IESA/UFG. 2011. (Tese de doutorado).

MALULY, Vinicius Sodré. Como se fossem para o cabo do mundo: geohistória e cartografias sobre os caminhos e os descaminhos de Goyaz (1725-1752). Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade de Brasília, Brasília, 2017.

MORAES, Cristina de Cássia Pereira. A organização social da morte: Um estudo sobre a exclusão social no cemitério de Meia Ponte na província de Goiás em 1869. X ENCONTRO REGIONAL DE HISTÓRIA DA ANPUH/MG LPH: REVISTA DE HISTÓRIA. N 6, 1996.

__________________ 1ª edição. E-book. Jundiaí, SP: Paco Editorial, 2014. Do Corpo Místico de Cristo: Irmandades e Confrarias de Goiás 1736 – 1808.

NÓBREGA, José Claudino da. Memórias de um viajante antiquário. São Paulo: Raízes. 1984, p. 91-92

PALACIN, Luís, GARCIA, Ledonias Franco, AMADO, Janaína. História de Goiás em documento. Goiânia: UFG, 1995.

SAINT–HILAIRE, Auguste. A viagem às nascentes do Rio São Francisco e pela província de Goiás. Ed. USP, 1975.

SILVA, Cônego J. Trindade da Fonseca. Lugares e Pessoas. São Paulo: Escolas profissionais Salesianas, 1948.

UNES, Wolney; CAVALCANTE, Silvio Fênix. Restauro da Igreja Matriz de Pirenópolis. Goiânia: ICBC, 2008. 240. p.: il.

elemento decorativo